Gal Costa: “Estratosférica”
Gravadora: Sony
Desde que lançou o álbum “Recanto” (2011), Gal Costa ampliou seu público jovem. Apesar da produção do velho parceiro Caetano Veloso, o disco representou uma nova direção estética: guitarras e timbragens eletrônicas substituíram as influências da bossa nova e tropicalista que permearam os mais consagrados discos da cantora.
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Em “Estratosférica”, Gal Costa acena para a nova geração, mas vai com calma. A primeira canção, “Sem Medo Nem Esperança”, é um rock de personalidade composto por Antônio Cícero: “Nada do que fiz, por mais feliz, está à altura do que há por fazer”, filosofa sobre a soberba musicalidade imposta por Arthur Nogueira.
Isso não aponta a direção do disco. É apenas um choque para prender a atenção do ouvinte. Mesmo porque o rock só é retomado quase no final do disco, em “Anuviar” (de Moreno Veloso e Domenico Lancellotti).
Já conhecida do público, o single “Quando Você Olha pra Ela” pode ser considerado uma atitude ousada por parte de Gal: a letra é da jovem Mallu Magalhães. (Até onde se sabe são os novos expoentes que buscam apoio dos velhos, muito raramente acontece o contrário.) Com requinte de MPB carioca. que Gal considera ‘jorgebenjoriana’, a composição dá jovialidade à cantora, atualmente com 69 anos.
O namorado de Mallu, Marcelo Camelo, também colabora: é dele a autoria de “Espelho d’Água” (parceria com Thiago Camelo), que não foge do timbre já explorado há muito pela cantora. Não se percebe, também, nenhuma novidade na abordagem que Gal dá a “Dez Anjos”, composição que sela parceria entre Criolo e Milton Nascimento. Os arranjos ficam presos demais à pior herança de Lincoln Olivetti (pianos marejados e percussão econômica).
Olivetti, por sinal, registra em “Estratosférica” suas últimas investidas musicais (ele faleceu em janeiro de 2015). É dele o arranjo da faixa-título, com clara inspiração de “Festa do Interior” (do disco “Fantasia” [1981], de Gal Costa). A mais instigante faixa do álbum foi composta por Céu, Pupillo (baterista do Nação Zumbi) e Junio Barreto – que também colabora no delicioso groove a dois “Jabitacá”.
Lincoln Olivetti também compôs um tema inédito para Gal, “Muita Sorte”, que une o estilo de Dorival Caymmi às pirotecnias de estúdio de Kassin.
Após divulgar maciçamente a turnê “Recanto”, o disco “Estratosférica” mostra que a cantora não quer distanciar o que construiu em mais de quatro décadas de carreira. Para cada colaboração de algum representante da nova geração, há a intermediação de um experiente. Em “Ecstasy”, de Thalma de Freitas, por exemplo, João Donato toca piano Rhodes; Zeca Veloso tem a ajuda do pai Caetano Veloso na composição “Você Me Deu”, um dos poucos resquícios da fase “Recanto”.
Apesar de sugerir algo radical, “Estratosférica” apenas intermedia os gostos de novos e velhos fãs.
Maria Gadú: “Guelã”
Gravadora: Slap/Som Livre
Consagrada pelos famigerados medalhões da MPB, como Caetano Veloso e Gilberto Gil, Maria Gadú possui o apelo comercial de uma Ana Carolina quando o assunto é vender discos. Com o disco homônimo de 2009, a cantora balançou os tradicionais meios radiofônicos com o hit “Shimbalaiê”.
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“Guelã” é o terceiro disco da compositora, e vem com a nada inédita intenção de ‘respirar outros ares’.
Estranho como o título, o disco é mais acústico, concretista, com canções menos palatáveis. “Trovoa” sugere a complexidade de um encontro, enquanto “semi-voz” faz um inesperado passeio estético.
Canções como “obloco”, “ela” e “tecnopapiro” têm espaço nos circuitos pop, ainda que estejam carregadas desse novo apuro sonoro que a cantora fez questão de buscar. A perder ela não tem, mas será que a aceitação dessa nova obra será tão imediata como as anteriores?
The Vaccines: “English Graffitti”
Gravadora: Columbia
Quando surgiu, em 2011, The Vaccines foi direto ao ponto em seu indie-rock enérgico. Com “Come of Age” (2013) veio a precoce ‘maturidade’, termo cada vez mais dúbio quando se fala de música pop.
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“English Graffiti” se encaixa na proposta do que representa ser uma ‘banda que lota estádios’ hoje em dia: do lounge massivo de “Minimal Affection”, passando pela balada “Want You So Bad”, a banda atinge altos picos expressivos em “20/20”, diversificando a sua sonoridade sem perder o ouvinte no meio do caminho. Primeiro, claro, o Vaccines precisa arrancar o estrondo do público norte-americano para seguir rumo à aceitação global, como fez bandas hoje grandiosas como Muse e U2.
“English Graffiti” é o caminho. Não dá pra pegar atalho.
A$AP Rocky: At.Long.Last.A$AP
Gravadora: RCA
A$AP Rocky está mais sério – pelo menos, é o que mostram as batidas de seu segundo álbum de estúdio “At.Long.Last.A$AP”. Bateu a consciência no rapper do Harlem que se esbaldou em festa com Skrillex no hit “Wild For the Night”? Não, o que bateu foi a necessidade de trazer mais colaboradores.
Os momentos em que canta sozinho – especialmente na trinca “L$D”, “Excuse” e “JD” – são misteriosamente melancólicos. De primeira, o ouvinte anseia pelas participações de M.I.A. (em “Fine Wine”, com Future e Joe Fox) ou do badalado Kanye West (em “Jukebox Joints”), à procura da dinâmica que ficou tão fortemente estabelecida em “Long.Live.A$AP” (2013).
Surge, então, a luz no fim do túnel: A$AP Rocky quer pavimentar um caminho mais sóbrio e taciturno, e isso pode demandar esforço por parte dos ouvintes.
Unknown Mortal Orchestra: “Multi-Love”
Gravadora: Jagjaguwar
Já no terceiro disco, chamar o Unknown Mortal Orchestra de retrô passou a ser redundante. A sacada é entender que cena eles passaram a mirar. O primeiro álbum, homônimo, cravou no acid-rock. O segundo, “II”, no rock psicodélico. “Multi-Love” é bem multifacetado: segue coerentemente no disco-funk experimental em “Can’t Keep Checking My Phone”, uma de suas composições mais espertas até o momento, e não tem medo de visitar o indie-fofo na faixa-título.
As composições do UMO também estão mais criptografadas. Em “Extreme Wealth and Casual Cruelty”, a voz de Ruban Nielson se esconde num rock borbulhante para estabelecer a ligação entre o fora de uma garota e o desprezo de uma sociedade. “Necessary Evil” carrega a densidade de um Brian Wilson e fala sobre as barreiras afetivas entre o vocalista e o pai dele. O clima de calma, predominante na primeira metade da canção, parece transfigurar, mas pouco muda – indício de que muito da personalidade do UMO ainda pode surpreender os ouvintes.